Valor Divino do Humano - Jesus Urteaga Lodi

Compreendi a frialdade dessas almas quando senti no meu íntimo aquele repto que refletiam os olhos dos pagãos: “Demonstrai-nos com vossas vidas que Cristo vive!”.Valor Divino do Humano - Jesus Urteaga Lodi

segunda-feira, 18 de julho de 2011

RELIGIÃO DE POBRES E ESCRAVOS

“O Cristianismo na sua origem era religião de pobres e escravos”
Li esta frase num livro e logo pensei: está errado, mas é a opinião de, talvez, a maioria das pessoas que não têm uma sólida formação cristã.
Através do tempo, nestes dois milênios de Cristianismo, muitas histórias foram contadas através de livros, cinema, vídeos, televisão, etc. Algumas mais fieis à realidade, outras menos, e outras totalmente de ficção tomando do cristianismo apenas os personagens.
Mesmo entre os autores ou diretores que foram fiéis aos acontecimentos, houve quem não se tomou o trabalho de estudar a sociedade da época, e quem fizesse “cortes” para adequar a historia real com a trama do livro ou filme.
Mesmo as pessoas que se consideram “muito católicas” por vezes só conhecem dos Evangelhos os trechos lidos nas missas dominicais.
Aos poucos, a essência da religião foi sendo substituída pela fantasia e pelo “achismo” da livre interpretação sem base.
Hoje em dia a superstição se mistura à religião que muitas vezes é apenas encarada como talismã para livrar-mos dos problemas que não podemos ou não queremos dar-nos o trabalho de lutar para resolver.
Durante séculos, populações isoladas, abandonadas pelos governantes, com escassa cultura, e ainda menos recursos, tinham como única certeza o amor do seu Deus, e fizeram da sua fé uma tábua de salvação.
Tudo isso contribuiu para formar uma mentalidade onde a religião passa a ser apenas o recurso do pobre que não tendo como ser feliz nesta terra, vive na ilusão de uma felicidade pós morte.
Mas não é essa a realidade evangélica. Quem lê os Evangelhos e conhece os personagens, sabe que a mensagem divina não é sectária, é universal. É tanto para pobres como para ricos.
O Precursor: São João Batista
Segundo o Evangelho de Lucas, João, mais tarde chamado o Batista, nasceu numa cidade do reino de Judá, filho do sacerdote Zacarias e de Isabel, parenta próxima de Maria, mãe de Jesus.
A imagem que ficou gravada na mente das pessoas é a apresentada pelos evangelhos de Mateus e Marcos: “João usava uma vestimenta de pêlos de camelo e um cinto de couro em volta dos rins. Alimentava-se de gafanhotos e de mel silvestre” (Mt 3, 4).
A “pobreza” de João na realidade era a austeridade de um eremita, escolhida quando adulto consciente da sua missão de precursor de Cristo.
João não pertencia a uma família pobre. Seu pai era “um sacerdote por nome Zacarias, da classe de Abias” (Lc 1, 5); ou seja, pertencia à classe sacerdotal, a mais nobre dentro da sociedade da época.
Os Apóstolos
Dentre os muitos discípulos que O seguiam, Jesus escolheu 12 para conviver mais de perto com Ele para melhor formá-los. Esses discípulos conhecidos como Apóstolos, serão os fundadores da Igreja e continuadores da missão de Jesus.
Todos lembram de Pedro, pescador da Galiléia, e de Judas o traidor; mas, quantas pessoas lembram sequer o nome dos outros 10 apóstolos ou suas profissões? Muitos pensam que todos os apóstolos eram “pobres pescadores ignorantes”.
Pedro e André foram pescadores, mas não os vejamos com a posição social dos pescadores do nosso século que trabalham duro para vender muito barato o peixe para as grandes indústrias ou atacadistas que ficam com todo o lucro.
Naquela época não existiam indústrias de congelados nem enlatados. O pescador estava no topo da linha de produção. Ele pescava e vendia o peixe geralmente para o consumidor final.
Tiago e João Evangelista eram filhos de Zebedeu “rico pescador de Betsaida”1. Conforme se pode comprovar pelo evangelho de São Marcos, Zebedeu tinha empregados trabalhando com ele além dos filhos (Mar 1, 20), por tanto não era um “pobre pescador” e Pedro era seu sócio (Lc 5,10).
Mateus, cujo primeiro nome era Levi, era coletor de impostos, profissão desprezada pela maioria dos judeus, pois o coletor trabalhava para os romanos, os invasores que subjugavam o país e tinha fama de enriquecer na profissão não sempre honestamente.
Quando Jesus chama Mateus, ele prepara um banquete para receber-lO ao qual “muitos cobradores de impostos” também compareceram (Mar 2, 14-15). Isso demonstra que não era pobre, tinha posses suficientes para dar um banquete a qualquer momento e para muitas pessoas.
São Lucas, no capítulo 8 do seu Evangelho, nos narra que o grupo que acompanhava Jesus era formado pelos 12 apóstolos e mais algumas mulheres que possuíam posses com as quais financiavam, por assim dizer, o trabalho apostólico do Mestre: “...Jesus andava pelas cidades e aldeias anunciando a Boa Nova do reino de Deus. Os doze estavam com ele, como também algumas mulheres... :Maria, chamada Madalena, da qual tinham saído sete demônios, Joana, mulher de Cuza, procurador de Herodes, Susana e muitas outras, que o assistiam com as suas posses.” (LC 8).
Na hora da morte de Jesus, também foram seus discípulos ricos que acudiram no seu auxilio. O sepultamento de Jesus não foi numa cova comum como se costumavam enterrar os crucificados, “um homem rico de Arimatéia, chamado José, que era também discípulo de Jesus, foi procurar Pilatos e pediu-lhe o corpo de Jesus... o depositou num sepulcro novo, que tinha mandado talhar para si na rocha” (Mat 27,57-60). “Acompanhou-o Nicodemos, ... levando umas cem libras de uma mistura de mirra e aloés.” (Jo 19,39) Cem libras são 45,36kg, uma enorme quantidade de aromas, o que demonstra além do grande carinho do discípulo, uma posição econômica folgada.
O início da Igreja - Os primeiros séculos: a expansão
Logo depois da ressurreição de Jesus, seus discípulos são perseguidos pelas autoridades judaicas no intuito de acabar de vez com seguidores de Mestre tão incômodo.
Nessas circunstâncias se destaca o jovem Saulo, que posteriormente vai ser um dos pilares da Igreja: São Paulo. Tudo faz acreditar que Paulo pertencia a uma família abastada. “Paulo fazia questão de dizer que era Cidadão Romano (At 16,37; 22,25), e que tinha esse direito «de nascença» (At. 22,29), isto é, recebeu-o do pai. Quer dizer que o pai ou avô de Paulo conseguiu apropriar-se da Cidadania Romana a ponto de poder passá-la para os filhos, e isso requeria «vultosa soma de dinheiro»(At 22,28).” 2  
São Paulo, o Apôstolo dos Gentios, como se costuma chamar, foi o principal responsável pela expansão do cristianismo pela Ásia Menor e a Grécia. Seguindo o mandato evangélico: “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda criatura” (mar 16, 15), não fez acepção de pessoas, dirigiu-se a todos, ricos e pobres, livres e escravos, judeus e não judeus. Dentre as pessoas que se converteram ao cristianismo através da pregação de Paulo podem contar-se tanto pessoas simples e de baixos recursos, como pessoas ricas e influentes, e até autoridades como o procônsul de Chipre.
Com a perseguição na Judéia, os primeiros cristãos se espalham pelo mundo a fora seguindo a ordem do mestre: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa Notícia a toda a humanidade” (Mc 16,15).
Por volta do ano 110, um escritor romano, Plínio, escreve ao imperador Trajano que os cristãos eram “muitos, de todas as idades, de toda a condição, de um e outro sexo”3

Já um século mais tarde é Tertuliano quem descreve a abrangência dos cristãos dentro do Império Romano: “Somos de ontem e já enchemos as vossas cidades, as vossas casas, as vossas praças, os vossos municípios, os conselhos, os campos, as tribos, as decúrias, o Palácio, o Senado e o Foro; não vos deixamos senão os vossos templos.”4  
A época dos mártires
Os cristãos dos primeiros tempos viviam sua fé de forma total, e essa forma de vida chocava os costumes do povo romano em geral e preocupava as autoridades.
Já no primeiro século começaram as persecussões em massa. As ATAS DOS MÁRTIRES recopila uma serie de testemunhos desses primeiros cristãos que doaram sua vida pelo Mestre.
Nessas atas podemos encontrar uma ampla variedade de profissões dos cristãos que foram martirizados.
Alguns exemplos:
Felicidade: nobre matrona romana.
Pontino : bispo da cidade de Lião.
São Vito: de família patrícia.
Blandina: escrava.
Felicidade (outra): escrava
Cosme e Damião: médicos.
Santa Perpétua: jovem romana de estirpe nobre.
Sereno: jardineiro
Flávio Clemente: cônsul (e a sua esposa Flávia Domitila).